quinta-feira, 10 de junho de 2010

Nesta síntese tomamos como base o capítulo A Flexão modo-temporal no Português culto do Brasil: Formas de Pretérito Perfeito e Imperfeito do Indicativo, contido no livro Gramática do Português Falado, escrito por Ataliba Teixeira de Castilho.
Os pesquisadores analisaram ocorrências do pretérito perfeito e imperfeito do indicativo colhidas em 180 minutos de gravação, correspondentes 30 minutos a cada um dos modos-temporais das cidades de São Paulo e do Rio de Janeiro. No material de análise, do projeto PGPF, há as formas simples de cada modo-temporal, nas quais os sufixos ou as desinências constituem as categorias tempo, modo e aspecto no vocábulo verbal. Em português, considera-se que essas categorias são indicadas pela desinência verbal. Além disso, por meio das formas coletadas, analisou-se que nos verbos regulares as formas de pretérito imperfeito resultam da adição do sufixo modo-temporal ao tema verbal. Ex: chamava, trabalhava, entrava (adiciona-se –va aos verbos de primeira conjugação); queria, fazia, havia (com /i/ tônico, aos verbos de segunda e terceira conjugação).
Do verbo se irradia a interpretação semântica para todo o complexo que a sintaxe organiza no nível frasal; é o verbo que projeta a especificação das relações que com ele contraem os participantes (argumentos) (Neves, 1992, PP.22-3). Estamos pensando no significado que depende das relações contidas nas frases ou nas características sintático-semânticas das formas verbais analisadas. Com isso, impõe-se que se leva em conta a significação das formas verbais flexionadas em termos de características que estuda a linguagem em situação de uso, ou por meio dos significados construídos a partir de relações textuais ou discursivas. Tal abordagem liga-se ao fato de que a maior parte dos elementos lingüísticos é multifuncional, o que inviabiliza sua análise isolada e, por outro lado, favorece o estudo de cada uma das formas no contexto em que ocorre.
O estudo dos valores das formais verbais estabeleceu três momentos que servem de apoio para a definição dos tempos verbais: o momento da fala (MF), o momento em que ocorre o evento (ME) e um terceiro momento, referencial aos dois primeiros (MR) (Reichenbach, 1975, p.288), sistema fixo através do qual o falante transmite ao ouvinte a sua perspectiva temporal.
Por outro lado, vamos analisar as formas verbais de pretérito perfeito e imperfeito com a presença ou ausência de expressões temporais e para isso usaremos de dois momentos: no primeiro momento a forma verbal isolada, quando o morfema modo-temporal, somente ele, é responsável pela especificação do complexo significativo modo, tempo, aspecto; e no segundo momento será levado em conta as formas de pretérito combinadas com expressões adverbiais. Exemplificando:

(1) (Bom, a gente vai ver hoje) [...] nós vimos que o início da industrialização nos Estados Unidos
(EF-RJ-379:1-9)

(2) Vocês viram aqui que o total da população ... (EF-RJ-379: 31-3)

(3) não tinha nem onde sentar viu ? (DID- SP-234: 137)

(4) é um um uma peça um mas esse tinha tanta molecada (DID-SP-234: 125)


(5) realmente é gozado como a gente não comia fruta (DID-RJ-328: 88-9)

As formas verbais em itálico mostram que os interlocutores as empregam para relatar eventos percebidos por eles ou por qualquer outro observador, como reais, pois esses eventos já aconteceram em algum momento que antecedeu o próprio relato do evento.
Nas frases com pretérito perfeito, a referência ao momento da enunciação é reforçado pelas formais pronominais (nós, vocês), morfemas verbais de 1ª e 2ª pessoas (vimos) e advérbios (aqui), elementos que atestam a relevância que o evento expresso pelo verbo ver tem para o locutor no momento da enunciação (MF).
As formas de pretérito imperfeito remetem a eventos que tiveram lugar num espaço e tempo mais ou menos extenso no passado; trata-se de um relato ocorrido no passado visto a partir de uma perspectiva também do passado. É o tempo da simultaneidade no passado, que trás a noção de acontecimento, fatos, ações habituais. Ex: trabalhava, fazia. Já o pretérito perfeito refere-se a um evento que se situa no passado que nos dá a certeza de que aconteceu. Ex: Vaguei pelas serras.
Com isso, analisamos as formas verbais isoladas, agora vamos vê-las associadas aos advérbios.
Os possíveis advérbios que acompanham os tempos verbais de pretérito perfeito e imperfeito, considerando as características próprias dessa modalidade de língua ligadas à interação verbal. Segundo Betten “assim que você percebe que o ouvinte compreendeu o que você queria comunicar, torna-se desnecessária e inadequada a continuação de sua fala em muitas situações”. Diante disso, podemos dizer que, na língua falada, a omissão de advérbios ocorre devido a esse fato. Já na língua escrito este fato não ocorre, pois não há um contexto compartilhado entre os interlocutores e em enunciados formais, nota-se que esse fato também ocorre, pois uma vez feita à localização temporal, o falante não vê necessidade de repeti-la cada vez que faz menção ao evento.
O fato de considerarmos o verbo em isolamento como objeto de análise, no sentido de que somente ele tem sentido e é responsável pela especificação do complexo significativo modo-tempo-aspecto mostrou ser útil, fornecendo elementos para a interpretação semântica das formas de pretérito. Mais especificamente, fornecendo elementos para a postulação de uma dupla oposição entre as formas de pretérito perfeito e imperfeito, a temporal e a aspectual.
Em suma, a dificuldade em estudar os valores das formas verbais flexionadas está no envolvimento do complexo significativo modo-tempo-aspecto com a gramática das construções.


Referências Bibliográficas

Castilho, Ataliba de Teixeira. “A Flexão Modo-Temporal no Português culto do Brasil: Formas de Pretérito Perfeito e Imperfeito do Indicativo”, pág 31. GRAMÁTICA DO PORTUGUÊS FALADO. Vol. IV.: Estudos Descritivos. Campinas, SP: Editora UNICAMP, 2002.

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